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Opinião

Tragédia gaúcha está terminando, é a hora da imprensa apontar os responsáveis

Governador Leite sugeriu o debate sobre o adiamento das eleições municipais

Publicada em 22/05/2024 às 12:29h

Carlos Wagner


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Marina
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As águas das enchentes que espalharam tragédias pelo território gaúcho estão baixando. É chegada a hora da grande imprensa, em especial a gaúcha, investigar e noticiar as responsabilidades dos governantes nos acontecimentos. Olha, por ser um velho repórter, 73 anos, 40 de profissão envolvidos com matérias complicadas na área de conflitos agrários, migrações e crime organizado nas fronteiras, sei que neste ano será difícil apurar a responsabilidade de ocupantes de cargos executivos devido as eleições municipais, as mais acirradas do calendário eleitoral brasileiro. Mas também tenho consciência de que a apuração precisa ser feita agora, por exigência do novo normal do clima, o que significa que a curto prazo podemos ter outro evento parecido com a amplitude da tragédia atual, que atingiu mais de meio milhão de pessoas em 320 dos 497 municípios gaúchos e deixou até aqui um saldo de 159 mortes e 88 desaparecidos. Foi a terceira enchente de grandes proporções nos últimos nove meses no Rio Grande do Sul, que custaram a vida de 214 pessoas e bilhões de reais de prejuízos com a destruição da infraestrutura (urbana e rodoviária), moradias, lavouras, fábricas e comércio. Porto Alegre, a capital dos gaúchos e uma das raras cidades brasileiras que conta com um sistema de proteção contra as cheias, se tornou o “cartão-postal” da soma dessas três tragédias. No primeiro domingo de maio, as águas do Guaíba atingiram a cota de 5,31 metros, invadindo o Centro Histórico e vários bairros e ultrapassando com folga os 4,76 metros da enchente de 1941, que até então ostentava o título de ter sido a maior já registrada em Porto Alegre.

Portanto, se a imprensa não agir, pressionando pela apuração das responsabilidades dos dirigentes na tragédia gaúcha, pode se tornar, perante a opinião pública, cúmplice do próximo evento. Lembro que a cobertura sobre as enchentes, em especial a última, foi bem-feita pela grande imprensa nacional e internacional. E que os sites e blogs independentes publicaram preciosas e precisas informações sobre os bastidores dos acontecimentos. Todas essas informações publicadas estão dispersas por aí. Graças às novas tecnologias de comunicação, elas podem ser reunidas apertando alguns botões no teclado. Isso facilita a nossa tarefa de juntá-las e traçar um roteiro de apuração. Sugiro que a apuração comece pelo cartão-postal da soma dessas três tragédias: o colapso do sistema contra as cheias da Capital. Há consenso entre os jornalistas de que foi causado pela falta de manutenção no sistema, erguido nos anos 70. O governador gaúcho, Eduardo Leite (PSDB), colocou em dúvida a unanimidade da opinião dos jornalistas. Acrescentando que o colapso pode ter sido causado pelo volume de água muito acima para o qual o sistema foi projetado. Quem terá que dar explicações será o prefeito da Capital, Sebastião Melo (MDB), que é candidato à reeleição. Não dá para atirar a bronca toda no colo de Melo, ele teve o azar do rolo ter estourado na sua gestão. Mas, por ser o atual prefeito, terá que explicar os motivos pelos quais não fez a manutenção adequada no sistema contra as cheias. A seu favor há o fato de que, neste meio século de existência do sistema, não consta que nenhum dos nove prefeitos eleitos e os três nomeados durante a ditadura militar (1964 a 1985) tenha feito a manutenção. Falei sobre o assunto no post publicado em 10 de maio: Destino do sistema contra as cheias de Porto Alegre decidirá a eleição do prefeito? A deputada federal Maria do Rosário (PT) é atualmente a principal adversária de Melo. Na segunda-feira (20), em entrevista ao jornal O Globo, o governador Leite disse que “o sistema falhou, e levaremos meses até voltar ao normal”. Na entrevista, ele afirma que o adiamento das eleições municipais deve ser debatido porque “a troca de governos municipais pode atrapalhar o processo de reconstrução”.

Se a sugestão do governador vai ganhar corpo e virar um debate entre os candidatos a prefeito e vereador, ou será simplesmente ignorada até pelos seus aliados, temos que esperar para saber. Duvido que prospere. Mas, na disputa política, tudo é possível. A bronca do colapso do sistema contra as cheias de Porto Alegre não é do governador. O assunto com ele é outro. Vem sendo questionado por ter aproveitado a onda de destruição das leis ambientais no governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), entre 2019 e 2022, e ter feito mais de 40 mudanças na legislação de proteção ao meio ambiente do Rio Grande do Sul. Se essas mudanças, de alguma maneira, contribuíram para atiçar as três enchentes que destruíram o Estado, é um assunto para ser esmiuçado pela investigação jornalística. Leite afirma que as mudanças foram apenas atualizações burocráticas. Ele pretende ser candidato a presidente da República em 2026.

O ministro Paulo Pimenta foi nomeado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) como representante do governo federal na reconstrução dos estragos causados pelas cheias no Rio Grande do Sul. Nos bastidores circula a conversa de que ele não queria essa nomeação e só a aceitou por insistência do presidente. Por quê? Simples. Pretende concorrer a governador em 2026. Sendo representante do governo federal na reconstrução do Estado, sofrerá o desgaste natural do exercício do cargo, o que poderá prejudicá-lo nas eleições. Mesmo que tudo dê certo. Para arrematar a nossa conversa. Há notícias de que o Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul (MPRS) vai instaurar uma investigação sobre o sistema contra as cheias de Porto Alegre e sobre a devastação provocada em outras cidades. A entrada do MPRS no caso é uma garantia da responsabilização dos culpados pelo que aconteceu. E mais um argumento para os jornalistas se mexerem e começarem a esmiuçar os acontecimentos. É o que tudo mundo espera de nós.




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