A tragédia climática de maio deixou marcas na economia do Rio Grande do Sul. Dados setoriais divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), ao longo da semana passada, assinalam os diferentes comportamentos e traçam os desafios para a retomada das atividades, que já esboçaram reação em junho, seja na indústria, no comércio ou nos serviços.
A boa notícia, segundo economistas consultados por Zero Hora, é que a recuperação em curto prazo já começou. Mas a permanência dos efeitos em prazo mais alongado dependerá do sucesso do plano de recuperação, sobretudo, no que se refere à infraestrutura, além da efetividade dos programas de apoio emergencial ao setor produtivo.
Com a pior queda da história para um mês de maio, a indústria gaúcha amargou um tombo de 22,6% na Pesquisa Industrial Mensal(PIM), responsável por medir a produção física. O desempenho do setor no Estado também é apontado como uma das causas para a queda de 1% apurada na média nacional, em igual período.
Em maio, a performance foi negativa em 12 dos 14 segmentos industriais, conforme chama a atenção o economista-chefe da Fiergs, Giovanni Baggio.
Os reflexos mais acentuados foram nos produtos químicos (-5,21%), em razão da paralisação no Polo Petroquímico de Triunfo e nas máquinas e equipamentos agrícolas (-3,25%), que já enfrentava um ano de baixa, fruto de restrições impostas pelo governo argentino e da redução da demanda nos Estados do centro do país, por conta da diminuição das estimativas de safra.
Há ainda a queda de 2,8% no processamento de alimentos, sobretudo em razão das carnes, atingidas em cheio pela enchente no Vale do Taquari, e a retração de 2,28% nos veículos automotores.
— Acredito que em junho os dados sejam mais positivos, porque muitas empresas pararam por razões diretamente ligadas às enchentes ou por questão logística. Com a volta da atividade, o nível de produção melhora. Mas para o longo prazo teremos de lidar com uma série de problemas que a gente já tinha e com os que agora a gente tem — resume Baggio.
Comércio do Estado supera a média nacional
Em meio à enchente, alguns segmentos do comércio com peso relevante para a atividade ganharam impulso extra. O pânico inicial que levou grande massa pessoas às compras por estoque de alimentos e a onda de solidariedade subsequente, não apenas no Estado, mas em todo o país, elevaram os resultados no setor de hipermercados do RS e do Brasil.
De acordo com Patrícia Palermo, economista-chefe da Fecomércio-RS, a Pesquisa Mensal do Comércio (PMC) de maio confirma a trajetória do varejo nacional, observada ao longo do ano. Ela destaca que, além dos elementos que favorecem a demanda, como o mercado de trabalho aquecido e o crescimento do crédito para pessoas físicas, a dinâmica observada nos resultados do mês, quando no RS houve alta de 9,9% no Brasil de 8,8%, foi fortemente influenciada pela tragédia climática.
— Dado que essa hipótese não se concretizou, a estocagem de itens nas residências das famílias gaúchas acabou por representar um consumo antecipado, que deve impactar nas vendas futuras — comenta.
Ocar Frank, economista-chefe da CDL-Porto Alegre, lembra que segmentos como o farmacêutico também ajudam a explicar os resultados. Além disso, com o início do processo de reconstrução, afirma Frank, houve o aumento na demanda por produtos para viabilizar o retorno das famílias às suas casas, o que estimulou o consumo de itens como móveis e eletrodomésticos, que apuraram alta de 19,2% e 10,5%, respectivamente.
— Pela importância que esses bens têm para restabelecer um padrão de normalidade das famílias que foram atingidas, há esse aumento — avalia.
Entre os desempenhos, negativos, a venda de veículos, impossibilitada pela falta do sistema de emissão de notas fiscais, fora do ar por 20 dias, e pelos prejuízos nas concessionárias, caiu 34%.
Impacto no turismo puxa queda de 5,4% nos serviços
Na comparação entre maio de 2023 e 2024, os impactos verificados nos chamados serviços prestados às famílias registraram queda de 28,3% no Rio Grande do Sul.
Esse grupo, que responde por percentual ampliado do desempenho dos serviços de maneira geral, e inclui os alojamentos e a alimentação, ambos aspectos ligados ao turismo, é apontado pelo economista-chefe da CDL-Porto Alegre, Oscar Frank, como a principal causa do descolamento da performance do Estado e a do país.
Enquanto no país o setor avança 0,10%, no Rio Grande do Sul houve queda de 5,4% em maio. Segundo Frank, esse dado já aparecia em outros termômetros e acabou confirmado pela Pesquisa Mensal dos Serviços (PMS) do IBGE.
— Uma parcela considerável está atrelada ao turismo. E a gente sabe o quanto que o turismo foi prejudicado em função de toda essa situação das enchentes, estrago nos modais de transporte, fechamento do aeroporto, danos às estradas. Tudo isso acabou, e a própria queda da renda junto com a queda na parte de serviços profissionais, administrativos e complementares contribuíram para o cenário.