Sem água potável em casa, em meio às inundações que atingem o Rio Grande do Sul, uma moradora da zona norte de Porto Alegre decidiu recorrer ao abastecimento de um caminhão pipa nesta semana. A mulher acabou se tornando uma vítima de estelionatários. Criminosos vêm se aproveitando do momento de calamidade para aplicar golpes. 

O desespero dos atingidos e, até mesmo, a solidariedade de quem quer ajudar são iscas nestes novos métodos. Entre os tipos de trapaças detectadas até o momento estão o golpe do abastecimento de água, do qual a moradora da Capital foi vítima, o golpe do Pix solidário ou Pix falso e o golpe do helicóptero.

Assim como durante o período da pandemia do coronavírus, no qual os golpistas se aproveitaram para enganar novas vítimas, desta vez não é diferente. Os bandidos alteram a narrativa, mas o objetivo segue sendo o mesmo: obter lucro e vantagens das vítimas. Até o momento, a polícia não percebeu elevação dos casos de golpes.

— O que acontece agora é que aqueles variados tipos de golpes que eram aplicados foram direcionados para a catástrofe que vivemos. Se concentram nisso porque é oportuno — afirma a delegada Vanessa Pitrez, diretora do Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic), que está mobilizado para investigar denúncias de golpes relacionados as enchentes.

Nesta semana, a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) emitiu alerta sobre os casos de golpes em meio às doações para as vítimas das chuvas históricas que atingem o RS. A principal orientação, segundo a entidade, é que, quando for fazer uma transferência com um número de chave Pix, o doador confira com atenção todos os dados do pagamento e se o beneficiário é realmente quem irá receber o dinheiro.

— Muitos criminosos estão aproveitando o momento de comoção pública para criar chaves Pix e pedir dinheiro para sua própria conta. Quando for doar, confira o nome do beneficiário, empresa ou ONG e esteja certo se eles estão realmente fazendo campanhas de ajuda às vítimas. Também é muito importante que o cliente não clique em links recebidos por aplicativos de mensagens, de redes sociais e em links patrocinados em sites de busca — alerta José Gomes, diretor do Comitê de Prevenção a Fraudes da Febraban.

Golpe do Abastecimento de Água

Na última segunda-feira (6), ao perceber que o reservatório de água de casa havia esvaziado uma moradora de 29 anos do bairro Bela Vista decidiu buscar por abastecimento. A região onde ela vive com a família estava sem receber água desde o dia anterior.

— Coloquei no Google “caminhão pipa em Porto Alegre” e comecei a mandar mensagem. Daí cheguei nesse site. Não sei se o link redireciona ou se o próprio site é um golpe. Eles responderam e achei meio suspeito, pelo valor, mas estava sem águam, então tentei arriscar — relata.

A tabela ofertada mostrava diferentes valores, dependendo da quantidade de litros necessária. Para 5 mil litros, a cobrança foi de R$ 300,00. A moradora já havia contratado serviço de abastecimento anteriormente por um valor mais alto – R$ 580 para 3 mil litros de água. Isso gerou estranheza.

— Achamos barato, comparado a outras vezes em que tinha enchido a caixa. Eles também não pediram bairro, endereço, nada. Mas como tenho uma filha pequena, precisava muito de água — recorda.

A moradora fez o pagamento por meio do Pix. Ao fazer a transação, chegou a receber mensagem de alerta do banco de que poderia se tratar de fraude, mas reconheceu o pagamento.

— Depois disso, tentamos contato por mensagem e nunca mais responderam. Insistimos, ligamos, mas ninguém atende. Então assimilei que era um golpe. O sentimento é de raiva. As pessoas acham um jeito de fazer golpe em toda a situação. São oportunistas — lamenta.

Sem conseguir abastecimento em casa, a família seguiu a recomendação do prefeito de Porto Alegre Sebastião Melo e migrou temporariamente para o Litoral Norte.

Golpe do Helicóptero

Em Bento Gonçalves, na Serra, uma mulher desesperada para salvar três pessoas quase caiu em uma cilada. Ela foi procurada por um farsante que prometia fazer o resgate de helicóptero — mediante pagamento adiantado.

A mulher, que trabalha em uma pousada, conta que três pessoas estavam isoladas na hospedagem, numa encosta do Rio das Antas. As estradas para o local estavam todas bloqueadas. Por meio das redes sociais da pousada, a mulher pediu ajuda. Foi aí que recebeu mensagem com os contatos de alguém que estaria fazendo resgates aéreos.

Para o suposto resgate, o valor cobrado era de R$ 4 mil, mas R$ 2 mil teriam que ser pagos imediatamente.

— Três vidas valem muito mais que R$ 4 mil. Não me importava de pagar desde que tirassem eles de lá antes que acontecesse uma tragédia. No desespero pareceu fazer sentido — conta.

O golpe só não deu certo porque a mulher comentou o caso com a promotora de Justiça Cláudia Rodrigues Pegoraro, que logo desconfiou. A promotora relata que suspeitou da promessa de levantar voo mesmo abaixo de chuva.

— Não existe salvamento pago. Todos os resgastes são gratuitos. É tudo público e eles vão fazer quando for possível — afirma Cláudia.

Com a ajuda da Polícia Rodoviária Federal (PRF), uma pessoa conseguiu acessar o local e retirar os três em segurança.

Golpe do Pix Solidário ou Pix Falso

Segundo a delegada Vanessa Pitrez, diretora do Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic), golpistas estariam se aproveitando da solidariedade coletiva para cometer estelionatos, disfarçados entre diversas ações solidárias.

— São estelionatos virtuais, nos quais oportunistas estariam se passando por instituições que atuam em prol dos necessitados ou que finge estar arrecadando fundos para caridade — conta.

Postagens e mídias oficiais são adulteradas para enganar quem quer ajudar, simulando um pedido de doação confiável. Os golpistas costumam alterar somente a chave do PIX.  Dessa forma, o dinheiro é destinado às contas dos farsantes, desviando valores que seriam repassados para quem realmente necessita.

O Ministério Público do RS identificou perfis em redes sociais que buscam simular publicações do governo do Estado. Em entrevista à Rádio Gaúcha, a promotora de Justiça Maristela Schneider informou que medidas em resposta a estes casos já foram tomadas.

— Já estamos conseguindo rastreá-los, a fim de identificar os golpistas e de pronto já vão ser adotadas as medidas criminais cabíveis — informa.

Nestes casos, o que verifica a autenticidade da chave do Pix são os dados da conta, que aparecem nos aplicativos do banco antes do pedido de confirmação do envio.

Dicas de segurança

- Fazer preferencialmente doações a órgãos oficiais e confiáveis

?- Verificar se os perfis, sites, cards e pedidos de doação são verdadeiros, inclusive quando se intitularem de órgãos oficiais.

?- Verificar se o pix para o qual você está enviando dinheiro tem como destinatário o mesmo órgão, pessoa física ou jurídica que supostamente está solicitando a doação

- Os resgates estão sendo realizados por instituições como bombeiros, Defesa Civil, Exército, polícias e voluntários. Não realize pagamentos para realização de resgates.

- Desconfie de ofertas imperdíveis e valores muito baixos. São estratégias usadas pelos golpistas para atrair vítimas.

- Estelionatários também costumam pedir pagamentos adiantados e têm pressa em efetuar a transação. Fique atento a esse tipo de comportamento na hora de adquirir algum produto.

- Caso seja vítima de algum golpe, registre o caso na Polícia Civil. Só assim será possível investigar os crimes e chegar aos responsáveis.