A Polícia Federal foi acionada pelo governo Lula (PL) para fazer um relatório sobre o projeto de lei que proíbe delações premiadas de presos.
Havia uma previsão de que a urgência (que acelera a tramitação) da proposta fosse votada nesta terça-feira (11) na Câmara, mas a análise acabou adiada. Ainda assim, o tema pode começar a ser debatido pelos deputados nesta semana.
Segundo o diretor-geral da PF, Andrei Rodrigues, a corporação prepara uma manifestação a respeito do tema a pedido do Ministério da Justiça.
Ainda assim, como mostrou a Folha de S.Paulo, o governo trata o tema com cautela pelo potencial de desgaste. No passado, o próprio presidente Lula (PT) era um critico de delações firmadas por presos, sobretudo as que foram fechadas no âmbito da Operação Lava Jato.
O receio no Planalto é que qualquer posição do governo nesse caso seja usada por integrantes da direita e da esquerda contra Lula. Por isso, articuladores políticos defendem que o governo se afaste da proposta para evitar embates no Congresso Nacional.
Mesmo com a posição da PF, a tendência é que o Ministério da Justiça não se manifeste sobre o assunto.
Um integrante da pasta diz que é praxe da assessoria legislativa pedir manifestações técnicas. Isso não significa que o Ministério da Justiça vá elaborar um parecer e dar publicidade a ele. O relatório da PF pode, porém, embasar futuras decisões do governo sobre eventual veto ou sanção do projeto.
Em entrevista nesta terça, o diretor da PF evitou fazer um juízo de valor sobre a proposta analisada na Câmara. Disse que faz "parte do processo legislativo" e afirmou que as delações são importantes para as investigações.
"É um tema que tem dois vieses. A questão técnica está sendo enfrentada pela nossa diretoria de combate ao crime organizado. Nós fomos formalmente instados a nos posicionar e não vou antecipar a posição da PF", afirmou.
"A equipe está debruçada sobre essa minuta e deve, nos próximos dias, exarar a manifestação, subsidiando o Ministério da Justiça, que aí sim tem uma Secretaria de Assuntos Legislativos, que vai dar o encaminhamento, não sei se acolhendo ou não, à manifestação técnica da Polícia Federal", disse.
Andrei afirmou que as entidades de classe já se manifestaram sobre o tema e defendeu que o Congresso é o local para o debate.
"Nós respeitamos absolutamente o processo legislativo, esse é o segundo viés. Acho que o Parlamento é o ambiente, é um foro adequado para esse tipo de discussão, e que deve ouvir todas as partes interessadas, envolvidas na segurança pública, muito em especial, para que a gente tenha uma legislação adequada e que permita o enfrentamento ao crime organizado."
O diretor ainda classificou a delação premiada como um instrumento "importantíssimo" de investigação e disse que ela está sendo usada como deveria.
"A gente tem utilizado esse instrumento como ela sempre deveria ter sido utilizada como um meio de busca e obtenção de prova. Assim que a gente tem atuado. Mas a manifestação será técnica e será feita."
O tema voltou à tona na Câmara após o deputado Luciano Amaral (PV-AL), aliado de Lira, ter pedido na semana passada que um projeto de sua autoria que breca a delação de presos tenha regime de urgência. Quando uma proposta ganha urgência no Congresso, ela pode ir direto à votação em plenário, sem precisar passar por comissões temáticas, o que reduz a discussão sobre o assunto.
O texto, que pode ser alterado durante as votações, tem apenas dois parágrafos. O principal estabelece que a voluntariedade para a delação está ausente caso o interessado em colaborar com as autoridades estiver preso.
Em 2016, o deputado Wadih Damous (PT-RJ) apresentou projeto de mesmo teor, no contexto da Lava Jato, mas que não foi para frente.
Como pelas normas da Câmara, projetos mais recentes acabam sendo apensados a mais antigos, se o assunto for similar, o projeto de Luciano foi juntado ao de Damous.
Como mostrou a Folha, o pedido de urgência do projeto teve o aval de 13 partidos e a expectativa, tanto de líderes de partidos do centrão como da esquerda é que o projeto será aprovado na Câmara e, depois, no Senado.
Apoiam a tramitação acelerada do texto os líderes de Podemos, União Brasil, Solidariedade, PL, MDB e de blocos que reúnem PSD, Republicanos, PP, PSDB, Cidadania, PDT, Avante e PRD.
Especialistas divergem sobre a possibilidade de a proposta retroagir e anular situações em que já houve delações firmadas com detidos. Em caso positivo, o texto poderia beneficiar, por exemplo, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), alvo da delação do seu ex-ajudante de ordens Mauro Cid, assinada em 2023.