O primeiro semestre de 2023 foi de mudança nos termos de negociações salariais no país. Após anos de reajustes abaixo da inflação, empregados voltaram a obter ganhos reais em vencimentos.
O movimento foi captado por duas pesquisas diferentes. Tanto o boletim De Olho nas Negociações, do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), como o Salariômetro, da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), indicam que, desde dezembro, os acordos salariais fechados no país, na média, garantiram reajustes acima do aumento de preços.
A melhoria para os empregados começou tímida. Em maio, último mês com análises já publicadas, ela atingiu patamares recordes.
O Salariômetro da Fipe indicou que 91,9% dos acordos coletivos fecharam reajustes acima da inflação no mês –maior percentual da série histórica iniciada em 2015. A pesquisa ainda apontou que o reajuste médio dos salários foi de 5,3% –isso é 1,5 ponto percentual mais alto do que a inflação acumulada em 12 meses até maio (3,8%, medida pelo INPC).
Já segundo o Dieese, em 88% das 759 negociações com data-base em maio foram encerradas com aumentos reais aos trabalhadores. Desde 2018, quando a entidade passou a acompanhar os acordos e convenções coletivas, apenas em cinco ocasiões esse percentual havia ultrapassado a marca de 80%: em quatro meses em 2018 e um de 2019.
“De fato, observamos ao longo deste primeiro semestre, uma melhora nos resultados das negociações coletivas de reajuste salarial. Há um aumento no percentual de categorias que têm conquistado algum tipo de aumento real de salário, um reajuste salarial acima da inflação”, confirmou Victor Pagani, diretor adjunto do Dieese.
Inflação e crescimento
Segundo Pagani, há uma série de fatores que explicam essa melhoria. Ele lembrou que a inflação está em queda no país. Isso facilita que reajustes salariais negociados superem o índice de aumento de preços. Afirmou também que o mercado de trabalho brasileiro reaqueceu após o fim da pandemia, o que tende a elevar os salários.
Pagani disse também que o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) concedeu aumento extra para o salário mínimo em maio. Esse aumento empurrou o nível salarial do país para cima já que o reajuste do piso nacional serve como uma referência.
Por fim, o diretor adjunto do Dieese explicou que trabalhadores estão mobilizados em busca da recuperação de benefícios perdidos nos últimos anos. Na pandemia, eles foram obrigados a aceitar reajustes inferiores. Agora, contudo, querem compensá-los.
Hélio Zylberstajn, professor sênior da Faculdade de Economia da Universidade de São Paulo (USP) e coordenador do Salariômetro, vê o mercado de trabalho nacional mais aquecido. Ele ressaltou, porém, que os indicadores salariais apurados pela Fipe só dizem respeito ao mercado formal de trabalho, do qual fazem parte menos de 40% dos trabalhadores.
“O trabalhador informal é aquele sem carteira assinada ou que trabalha por conta própria. Esse tem que batalhar sozinho”, explicou Zylberstajn. “Agora, na medida que o mercado formal se equilibra, ele também acaba sendo beneficiado.”
Melhora relativa
Zylberstajn também afirmou que a melhora recente no mercado de trabalho é relativa. Os salários podem até ter crescido, mas ainda são baixos. Só vão melhorar de forma significativa se a economia voltar a crescer.
“A média salarial do trabalhador brasileiro é de R$ 3 mil reais. Cerca de 70% deles ganham até R$ 3,5 mil. Você acha isso bom?”, questiona.
Pagani, do Dieese, confirma que há muito caminho a ser percorrido. “Ainda convivemos com taxas de desemprego em patamares muito elevados, com taxas de subutilização da força de trabalho bastante altas, com uma precarização das relações do trabalho”, disse.
Edição: Rodrigo Durão Coelho