A Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) estima que R$ 72 milhões são necessários para expulsar todos os garimpeiros de sete terras indígenas mais afetadas pela atividade ilegal: Yanomami (RR), Karipuna (RO), Uru-Eu-Wau-Wau (RO), Kayapó (PA), Arariboia (MA), Munduruku (PA) e Trincheira/Bacajá (PA).
Estimada pela Funai no final de fevereiro, a cifra foi obtida com exclusividade pela reportagem do Brasil de Fato. O cálculo veio após decisão do ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), que ordenou a retirada imediata dos garimpeiros. Barroso determinou ainda a abertura de crédito extraordinário junto ao governo federal em quantia suficiente para cumprir a decisão.
O governo Lula (PT), que prometeu acabar com o garimpo em terras indígenas, começou a expulsar os invasores da Terra Indígena Yanomami, que vive uma crise humanitária provocada pela atividade. Especialistas e lideranças indígenas ouvidos pelo Brasil de Fato são unânimes ao afirmar que a medida deve ser estendida a outros territórios, que já começam a sofrer com aumento da fome, violência sexual contra mulheres, contaminação dos rios e mortes por doenças tratáveis.
A previsão de gastos está detalhada em uma planilha encaminhada pela Funai ao Ministério da Economia. Os custos mais vultosos envolvem transporte aéreo e terrestre e contratação de funcionários temporários, além de diárias para agentes das forças de segurança e servidores da Funai. Os gastos correspondem a uma mega-operação com duração de aproximadamente 12 meses.
Esta quantia necessária para expulsar os garimpeiros das sete terras indígenas equivale a apenas 0,001% do orçamento da União para 2023, que é de R$ 5,345 trilhões. Durante a gestão Bolsonaro, a mineração ilegal se tornou a principal causa de mortes por conflitos no campo. Segundo o último relatório da Comissão Pastoral da Terra (CPT), a atividade motivou 92% dos óbitos por conflitos em 2021.
Como conseguir o dinheiro?
Sem dinheiro, equipamentos e servidores suficientes, a Funai não tem condições de expulsar os garimpeiros sozinha. O orçamento da Funai despencou 40% em 10 anos, de R$ 1,1 bilhão em 2013 para R$ 645 milhões em 2023. Em 2020 o número de cargos vagos da Fundação (2300 cargos) era maior do que a quantidade de vagas ocupadas (2071).
Os R$ 72 milhões necessários para expulsar os garimpeiros correspondem a 11% de todo o orçamento da Funai previsto pelo governo Bolsonaro para este ano. Cerca de 70% da verba custeia os salários dos servidores. O restante é empregado na garantia de direitos sociais e territoriais para moradores de mais de 700 terras indígenas, que ocupam quase 12% do território brasileiro.
Por isso, Barroso ordenou a abertura do chamado crédito extraordinário, uma forma de liberar dinheiro do orçamento da União em situações imprevisíveis e urgentes. A modalidade foi usada, por exemplo, para pagar o Auxílio Emergencial e o Auxílio Brasil a trabalhadores informais no período mais crítico da pandemia de covid-19.
Medida Provisória do Executivo pode viabilizar expulsão de garimpeiros
O crédito extraordinário não depende de autorização prévia do Legislativo e pode ser liberado por meio de uma Medida Provisória (MP) editada pelo presidente Lula. A MP começa a valer ao mesmo tempo em que tramita no Congresso, mas depende da aprovação da Câmara e do Senado para que seja transformada em lei.
A Funai informou ao Ministério dos Povos Indígenas (MPI) que tem pressa para conseguir os recursos e já encaminhou a previsão de custos à Secretaria de Orçamento Federal (SOF) do Ministério da Economia.
A direção da Funai escreveu ao MPI que a expulsão dos garimpeiros dependerá também da articulação com outros ministérios, como Saúde e Segurança Pública, para consolidar os planejamentos operacionais e obter os recursos humanos técnicos e orçamentários necessários.
A nova gestão do órgão indigenista enfrenta o desafio de sair da paralisia em que foi colocada sob o governo de Jair Bolsonaro (PL), investigado por genocídio dos povos indígenas. Ignoradas nos últimos quatro anos, as demandas das organizações indígenas estão acumuladas.
Decisão foi conquista do movimento indígena
A decisão de Barroso foi tomada no âmbito Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 709, protocolada pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), com o objetivo de obrigar o governo federal a proteger os povos indígenas no período da pandemia de covid-19. A ADPF foi idealizada pelo então coordenador jurídico da Apib, Eloy Terena, que ocupa hoje o cargo de secretário-executivo