O Ministério Público do Trabalho (MPT) divulgou nesta sexta-feira (21) um levantamento em que aponta que já recebeu 1.112 denúncias de assédio eleitoral contra 918 empresas em 2022. O número de denúncias é mais de cinco vezes superior ao apurado em 2018, quando o MPT registrou 212 denúncias contra 98 empresas.
De acordo com o levantamento do MPT, que foi divulgado originalmente na quarta-feira (19) e teve os números atualizados nesta sexta, apenas a região Sul, com 321 denúncias contra 269 empresas, registrou mais casos de assédio eleitoral do que o País todo em 2018. No Rio Grande do Sul, foram registradas 85 denúncias contra 70 empresas.
Uma dessas denúncias resultou em uma decisão judicial contra a empresa de implementos agrícolas Stara, com sede em Não-Me-Toque (RS), a obrigando a garantir o direito de seus trabalhadores a votarem sem direcionamento. A ação é uma resposta a um comunicado divulgado pela empresa de que poderia reduzir investimentos em caso de derrota de Jair Bolsonaro (PL) na disputa pela presidência.
A região com o maior número de denúncias foi a Sudeste, com 447 contra 373 empresas. No entanto, o Estado com o maior número não foi São Paulo, e sim Minas Gerais, com 295 denúncias contra 253 empresas.
Em nota pública conjunta divulgada na segunda-feira (17), o Ministério Público Federal, o MPT e o Ministério Público de Minas Gerais (MP-MG) alertaram que é ilícita qualquer prática que tenha objetivo de excluir ou restringir a liberdade de voto dos trabalhadores.
“As prerrogativas do empregador, no âmbito do contrato de trabalho, são limitadas pelos direitos fundamentais, entre os quais se destacam o direito à liberdade de orientação política, à manifestação de ideias e ao voto direto e secreto. Portanto, ameaças a trabalhadores para tentar influenciar a escolha e obter o voto em favor de um ou mais candidatos ou candidatas ou sua abstenção podem ser configuradas como prática de assédio eleitoral e abuso do poder econômico do empregador, passíveis de medidas extrajudiciais e/ou judiciais na esfera trabalhista e eleitoral cível e criminal. Mais do que violações das normas que regem o trabalho, a concessão ou a promessa de benefício ou vantagem em troca do voto, bem como o uso de violência ou de coação para influenciar o voto são crimes eleitorais, previstos nos artigos 299 e 301 do Código Eleitoral”, diz a nota pública.
O ex-procurador do Trabalho e advogado Ronaldo Fleury avalia que o levantamento demonstra que a coação de trabalhadores tem sido banalizada e precisa ser contida.
“Esse assédio eleitoral é uma herança que remete a uma mentalidade escravocrata. Após a Abolição de 1889, a Constituição de 1934 praticamente universalizou o direito ao voto direto e secreto, com inclusão de mulheres e pessoas sem posses, ainda que mantivesse excluídos analfabetos, soldados, padres e mendigos. Foi então que começou uma prática no Brasil, completamente abominável, que é o voto de cabresto. Os empregadores acompanhavam os empregados à votação e exigiam que votassem em determinado candidato”, diz, em artigo.
Além disso, ele considera que o assédio moral cometido pelas empresas é uma forma de cabresto que emula a prática de “senhores de engenho” e revela uma mentalidade retrógrada do empresariado.
“São casos de violações como assédio moral e que ferem direitos de liberdade de expressão, de proteção da intimidade e de garantia de não discriminação dos trabalhadores e trabalhadoras. O ilícito do assédio eleitoral é criminal, por se tratar de um crime eleitoral sujeito a multa e a prisão. Também se constitui em uma infração trabalhista, que é o que está em apuração e em denunciando o MPT. Há o dano ao trabalhador individualmente e há o dano à toda coletividade pela violação do sistema eleitoral, que é regido pelo voto secreto e pessoal”, defende.